por Roberto Dias Duarte*
“Não importa que caminho tomar, se você não sabe aonde quer ir”, respondeu o Gato de Cheshire à Alice. Sim, aquela menina que foi parar no País das Maravilhas. Lembrei-me desta magnífica frase do felino de sorriso pronunciado porque, recentemente, presenciei uma discussão sobre qual seria a área mais lucrativa na contabilidade, diante de um jovem profissional ansioso por orientação de carreira.
Assim como em qualquer outra área, a resposta a esta questão poderia ser “todas” ou “nenhuma”, pois direcionar-se para a atuação em empresas ou ter em mente seu próprio negócio exige algo que nós, brasileiros, não estamos habituados a fazer: planejar.
Seja como intraempreendedor ou empreendedor, o primeiro passo para um bom planejamento é definir aonde se quer chegar. Esta definição deve se basear em prazos e números. Por exemplo, o profissional poderia ter como meta alcançar um cargo estratégico em uma corporação transnacional até os 50 anos de idade. Ou poderia estabelecer como objetivo acumular um patrimônio pessoal de R$ 5 milhões até os 30 anos. Outra opção seria definir como ideal a constituição de uma família e cuidar das saúdes financeira, física e moral de todos os seus membros.
Nenhuma destas opções seria necessariamente certa ou errada, não passam de exemplos. O fato é que apenas entendendo aonde queremos chegar seremos capazes de definir os caminhos e os meios para tal.
Qualquer que seja a rota a seguir, o próximo passo após esta escolha crucial é a análise de todo o contexto ao redor. E isto se faz olhando, primeiramente, para si próprio, a fim de entender alguns pontos básicos. Isto é, suas vocações, o que de fato o realiza, aquilo que reconhece fazer bem feito, mas também os pontos fracos e demais aspectos indesejáveis.
Depois, abra os olhos para os mercados local e global, questionando como estão as empresas, quais perspectivas elas têm, que nichos tendem a crescer ou simplesmente sumir.
Conceitualmente, este processo se denomina análise SWOT (forças, fraquezas, oportunidades e ameaças, na sigla em inglês) e sua aplicação irá direcioná-lo para as oportunidades mais promissoras e em quais segmentos vale a pena concentrar energias.
Só assim será possível criar um modelo de negócios (pessoal ou empresarial), identificando alguns elementos fundamentais: mercado de atuação e seu valor ofertado, formas de se relacionar com ele, canais de comunicação, receitas, atividades e recursos-chaves (humanos e materiais), parceiros e custos. Uma ferramenta simples e objetiva que nos ajuda a projetar tudo isto é o Business Model Canvas.
Outro fator muito importante para o sucesso profissional é a compreensão profunda de quem seja o cliente ideal. O que ele pensa, vê, fala, como age, quem o influencia e quais são suas “dores” e desejos. Com toda esta análise, pode-se construir um plano de ação, inicialmente formado por metas menores, para depois se atingirem objetivos de longo prazo.
Vamos analisar um exemplo hipotético de alguém que almeje uma carreira corporativa. Aplicando a matriz SWOT, a pessoa descobre sua vocação relacionada a questões tributárias. Além disso, tem facilidade com tecnologia da informação, mas sabe que suas fraquezas incluem dificuldade com a língua inglesa e o relacionamento interpessoal.
Com relação ao cenário externo, percebe no entorno apenas empresas pequenas e familiares, mas enxerga boas oportunidades em indústrias numa cidade relativamente próxima.
Ao montar o Canvas, nosso personagem hipotético entende que seu público-alvo são os executivos de multinacionais industriais. O valor que ele tem a oferecer engloba conhecimento técnico, dedicação, disciplina e ética. Para este perfil de público, o relacionamento deve ser profissional, porém individualizado. Os canais de comunicação mais importantes com este público são o LinkedIn, eventos corporativos e profissionais, assim como a existência de amigos em comum.
Analisando as possíveis receitas, percebe ainda que os salários e as bonificações para cargos mais elevados são atraentes. O que se pede, em contrapartida, são as capacidades de fazer planejamento tributário, liderar equipes, conduzir projetos e apresentar resultados em reuniões executivas.
Já os recursos primordiais para tudo isso consistem em bons conhecimentos técnicos, fluência em inglês, postura profissional adequada, facilidade com tecnologia, organização, habilidade de comunicação e no exercício da liderança. Os parceiros, por sua vez, os gestores de outros departamentos e consultores externos, enquanto os custos se relacionam basicamente a cursos e apresentação pessoal.
Levantadas todas estas informações, pode-se estabelecer pequenos objetivos para disciplinar e motivar a jornada. Um bom planejamento é capaz de ajudar no sucesso de qualquer empreitada. Desde a estruturação de um escritório contábil focado na competição por preço até aquele de alto valor agregado. No primeiro caso, ficará evidente a necessidade de milhares de clientes e a automação extrema de processos. No segundo, a importância da atuação por nichos, com serviços personalizados e consultivos.
Não estamos no País das Maravilhas, é verdade. Por isso, seguir caminhos errados pode levar não somente ao fim prematuro de uma carreira, mas também ao próprio fracasso pessoal. Convenhamos, pior do que não ter lucratividade em determinada profissão é mergulhar numa vida infeliz.
Portanto, considere seriamente a necessidade de aplicar estas técnicas de planejamento estratégico no seu dia a dia, pois é mais simples do que possa parecer. Dá trabalho, obviamente, mas quem espera uma solução milagrosa ou receita mágica para o sucesso provavelmente precisa de um choque de realidade, sob pena de se encaixar, juntamente com os seus pares, em outra frase emblemática do Gato de Cheshire: “realmente, somos todos loucos aqui”.
*Roberto Dias Duarte é sócio e presidente do Conselho de Administração da NTW Franchising, primeira franquia contábil do país.